quinta-feira, 6 de junho de 2013

O crime da MTV


    

Por incrível que pareça, o crime mais grave perpetrado pela MTV atualmente não é veicular clipes do Restart. O blog Testosterona, página relacionada ao site da MTV Brasil, está na mira de uma petição que hoje conta com cerca de 20 mil assinaturas contra seu conteúdo, considerado violento e preconceituoso.

Estranho o presidente da MTV Networks, Mr. Van Toffler, permitir que sua marca carimbe tal material: a mesma rede conhecida por veicular campanhas para promover a tolerância e a igualdade entre seu público jovem fecha os olhos para o jeitinho misógino de ser do blog. O Testosterona começou a cavar sua má fama em 2010, com a postagem de um vídeo em que ensinava como “convencer” uma mulher a fazer sexo anal quando ela se recusa; basta dar-lhe uma tijolada na cabeça que ela “apaga” e o caminho está livre. Ao final do vídeo, três motivos explicam porque o sexo anal é melhor: é “(…) mais humilhante para a mulher“.

Em março deste ano a polícia prendeu dois ex-colaboradores do Testosterona, Emerson Eduardo Rodrigues e Marcelo Valle Silveira Mello. Além de colaborar com o Testosterona, os dois mantinham seu próprio site para reforçar o discurso de ódio contra mulheres, homossexuais, negros, nordestinos e judeus. As investigações ainda ligaram Emerson e Marcelo a um grupo que planejava uma ação armada contra estudantes da Universidade de Brasília (UnB). Cereja no topo do bolo: Wellington Menezes de Oliveira, autor do massacre ocorrido em Realengo, no Rio de Janeiro, no dia 7 de abril de 2011, que resultou na morte de 12 estudantes, manteve contato com Emerson e Marcelo pedindo ajuda para planejar o ataque.

É. O Testosterona parece mesmo reunir a nata dos humoristas na internet. [Só que ao contrário.]

Amostra de “humor”

O editor do Testosterona, Eduardo Mendes, afirma no site: 
“Não sou machista, machismo é burrice e burrice é coisa de mulher.” 
E diz ser 
“um rapaz que acredita que toda mulher é uma rainha 
e a cozinha é seu castelo.” 

Secretária de Enfrentamento da Violência contra a Mulher, Aparecida Gonçalves, alertou em entrevista recente à CBN a respeito do aumento de violência sexual que vem sendo observado no país inteiro e ressaltou que, nesse ambiente, é inaceitável a existência “de blogs, sites ou programas de televisão que efetivamente incentivem esse tipo de coisa.” Mas o que seria esse tipo de coisa? De acordo com o SINAN – Sistema de Informação de Agravos de Notificação, esse tipo de coisa, a violência sexual, é toda ação na qual uma pessoa, em situação de poder, obriga uma outra à realização de práticas sexuais, contra a vontade, por meio de força física, influência psicológica, uso de armas ou drogas (Código Penal Brasileiro). Esse tipo de coisa é meio serinho: Em 2010 a Central de Atendimento à Mulher – SEPM (Ligue 180) divulgou o número de atendimentos de janeiro a maio daquele ano.

Somaram 271.719, um aumento de 95,5% em relação aos primeiros cinco meses de 2009 (138.985). Afinando o foco: foram 29.515 casos de violência física e 1.060 de violência sexual, descontando os demais. Segundo o Mapa da Violência divulgado pelo SINAN, em 2011 foram atendidas mais 13 mil mulheres vítimas de violência sexual (sem contar os casos não registrados oficialmente).

Reforçando: 
em um ano, os casos registrados de violência sexual contra a mulher saltaram de 1.060 a 13.000 

Nesse período, a Central 180 registrou 51.354 relatos de violência. Foram 29.515 casos de violência física, 13.464 de violência psicológica, 6.438 de violência moral, 887 de violência patrimonial, 1.060 de violência sexual, 42 situações de tráfico e 207 casos de cárcere privado.

Uma piada que celebra esse tipo de coisa, que retrata a definição acima, pode ser considerada humor por alguns. Mas da mesma maneira que não podemos ignorar que ela pode ser engraçada – para alguns – não podemos deixar de apontar que tal piada incita a situação acima descrita como violência sexual.

O vídeo da “tijolada” do sexo anal foi retirado do blog somente no mês passado, mais de dois anos depois de postado, e ainda pode ser acessado no YouTube, apesar de ter levado a Secretaria de Políticas para as Mulheres a solicitar do Ministério Público uma investigação sobre apologia ao estupro.

A All Out, organização internacional pela petição denominada “MTV Apoia o Ódio“, recebeu da Vice Presidente de Responsabilidade Social da emissora em Nova York uma mensagem decepcionante. Na nota, a MTV declara apenas que o Testosterona não passa de “uma abordagem bem-humorada do machismo moderno, adequadamente embasada na cultura brasileira” e que por isso não encerrariam sua parceria com o site. Para a MTV, esse tipo de coisa é bem coisa nossa! Para a MTV somos modernos neanderthals em cuja cultura está enraizado e é aceito o procedimento do ataque à tacape (ou tijolo) na cabeça da fêmea para obter sexo. Por isso devemos achar graça do tal vídeo postado no Testosterona.

Porque supostamente ainda possuímos vivo demais o registro dessa modalidade de convívio, tão entranhado em nós que é até de se espantar que nos revoltemos contra o conteúdo do vídeo e/ou de todo o Testosterona. Não se trata mais de uma questão para feministas nem feminazis. A mensagem da MTV chama a todos de ignorantes: tanto homens quanto mulheres.

2 comentários:

  1. Pelo menos a Abril perdeu o direito sobre a marca MTV. Eu sou uma das poucas pessoas que comemorou o fim da MTV Brasil do grupo Abril. Agora vamos torcer que, nas mãos da MTV gringa, a programação da MTV demonstre um mínimo de respeitos pelas mulheres.

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